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Sexta-feira, três e pouco da tarde... Deitado no sofá que também serve de porta-trecos e afins, na estreita sala da minha meia-água própria, estava este que vos escreve, despreocupadamente assistindo ao último capítulo da novela “Da cor do pecado”, no “Vale a pena ver de novo” da poderosa do plim plim... Dia de folga, sem aulas, nem horas-atividade, fazendo algo totalmente inútil, porém reparador... Com o tempo, a gente aprende que, coisas inúteis têm uma utilidade imensa quando nos fazer esquecer um pouco das coisas úteis...
De repente, meu labrador, melhor amigo, filho adotivo que acumula o cargo de cão de guarda começa a latir retumbante e incessantemente, atrapalhando desumanamente minha hora de fazer coisas inúteis para me sentir mais útil... O simba não late à toa, portanto, alguma coisa de errado devia estar acontecendo lá fora... Mas o sofá de fabricação própria estava tão cômodo que resolvi deixá-lo gastar um pouco mais do seu latim vulgar... A ele juntou-se a goeluda da Nala, com seu latido desesperado, mostrando que a coisa era realmente séria... Minha cadelinha, apesar de escandalosa, característica de muitas fêmeas das mais diversas espécies, só estranha o que é realmente estranho...
Ah! Como é bom sentir preguiça sem culpa! Mas tive que vencê-la e espichar o pescoço até a janela, abrir a basculante e ver, no meu quintal, pastando tranquilamente, um cavalo... “Um cavalo...” Falei baixinho e voltei a deitar... Um cavalo???... Levantei mais do que de pressa para me certificar que meus olhos astigmáticos e ceratocônicos não estavam me enganando... Era um cavalo mesmo, branco... Só me faltava encilhá-lo e sair em busca da princesa.... Esqueci do final da novela e fui, gentilmente receber o visitante... A casa fica nos fundos do terreno, então ele tinha uma vasta área de mato para devastar e defecar, não necessariamente nesta mesma ordem... Ao me aproximar, a ilustre visita me deu as costas, ameaçando um coice... Afastei-me, temendo por minhas costelas, mas foi possível observar que não era ele, era ela... Deixei a égua branca faminta curtir sua TPM em paz e voltei a deitar no sofá feito de chapa reciclada da campanha eleitoral passada e assistir ao último capítulo da novelinha, cujos capítulos anteriores não havia acompanhado assiduamente...
Novamente, Nala e Simba começam sua sinfonia... Meu Deus! O que foi agora?... Gritei de forma inútil, já que não havia outro ser humano em casa além deste que vos digita estas palavras. Mas não dá nada, pois era minha hora das coisas inúteis, esta atitude se inclui no pacote... E, pela janela reparei que chegaram mais dois ilustres visitantes para o banquete de capim fresco... Um cavalo, que preferi não conferir de perto seu gênero e um potro, ambos marrons... Deu a entender, de longe, que se tratava de uma família: papai, mamãe e filhinho... Ai que lindinho!...
E assim foi o resto da tarde... De vez em quando, meus cães se tocavam das presenças estranhas e abriam os queixos só para não perderem o costume... Já estava escurecendo quando me preparei para trabalhar novamente... Havia acabado o momento das coisas inúteis e, em breve eu estaria novamente no melhor lugar do mundo para se conhecer pessoas: a sala de aula... Pedi desculpas à família que me visitava e desejei que ficassem à vontade, mas não poderia acompanhá-los no jantar...
No caminho até a escola pensava: Isso é um bom sinal. Meu terreno é aberto, até o momento não foi feita a cerca que afasta os seres humanos de outros semelhantes, e ainda não tive nenhum problema por causa disso, apesar das inúmeras críticas àquele bairro... Porém, sempre recebo a visita de animais: gatos, cães de rua e da vizinhança que escapam e se sentem acolhidos ali, galos e galinhas, pássaros de todas as espécies e agora, cavalos... Qualquer pessoa ficaria irritada culpando os donos dos animais por estarem soltos ali. Mas meu coração passional agradece por poder receber estes seres irracionais que têm muito a ensinar a nós, que nos achamos racionais pelo fato de podermos dominar outros animais e os próprios seres humanos...